Por José Ronaldo – abril de 2011
Assentamento 25 de Maio, Santa Catarina, Brasil. A escola do MST, com pouco mais de 100 alunos dos 23 assentamentos do município de Abelardo Luz (SC), foi reconhecida como a melhor escola do município em exame aplicado pelo governo federal do Brasil
A Escola do MST “Semente da Conquista” colheu seus frutos: foi reconhecida como a melhor escola do município de Abelardo Luz, em Santa Catarina. A escola, que educa pouco mais de cem alunos dos 23 assentamentos do município com maior número de famílias assentadas do estado (1.418), foi destaque em 2009 no Exame Nacional de Ensino Médio (ENEM), aplicado pelo governo federal e etapa importante para ingressar nas universidades do Brasil. Um exemplo de que uma educação diferenciada e autonoma, construída com outros princípios que não a formação dos alunos para um mercado de trabalho competitivo (e urbano), pode obter bom desempenho inclusive segundo os padrões de avaliação do modelo hegemônico. A escola aplica um método alternativo de ensino, a Pedagogia da Terra.
O que segue é o relato de um professor e de dois alunos da “Semente da Conquista”. Eles nos contam como essa escola levantada no assentamento 25 de Maio difere das demais escolas do município e o que representou para eles esse êxito em um exame de referência nacional.
Escola Semente da Conquista: uma realidade escondida pela mídia. Robison Risso, professor na Escola de Ensino Médio Semente da Conquista a 3 anos, estudante do curso de Licenciatura em Educação do Campo – parceria ITERRA/UnB e Militante do MST desde a Adolescência
A Escola de Ensino Médio Semente da Conquista, como o próprio nome já sugere, é fruto da luta pela terra no município de Abelardo Luz, onde as famílias Sem Terra, de origem de varias regiões do Sul do País, deixaram de aceitar a situação de exploração e acomodação para serem protagonistas da historia e conquistarem um pedaço de chão para não somente dar o sustento a seus filhos, mas para construírem uma vida digna e ter seu espaço dentro da sociedade.
Para construir essa história, não bastava apenas a conquista da tão sonhada terra, mas também era preciso buscar outras questões de necessidade real e imediata, entre elas é a escola.
É nessa pedagogia, que a E.E.M. Semente da Conquista sempre teve sua base, respeitando o princípio do respeito pelos conhecimentos populares e disponibilizando aos educandos as ferramentas cientificas, para que ampliem a sua visão sobre a realidade em que vivem e possam sentir orgulho em afirmar que são camponeses. Essa busca pela construção do ser humano exige a saída das quatro paredes da escola convencional e a entrada no mundo real, pois, de nada adianta se deter ao livro didático, se o mesmo está descontextualizado e falando de uma realidade totalmente estranha aos olhos dos educandos. A base de todo o conhecimento é a vida concreta, é preciso banhar todo o estudo sempre com o que realmente interessa aos educandos, mas é claro não deixando de oferecer a eles os conhecimentos construídos historicamente pela humanidade.
Em nossa escola, os educandos não são espectadores, que estão ali esperando que um “ser iluminado” derrame em suas cabeças uma Avalanche de informações que precisem decorar e repetir em uma prova de avaliação, mas sim, eles que são o motivo da existência da escola, tem espaço para criticar, propor, avaliar e construir junto aos educadores e coordenação a educação de qualidade. Assim, acreditamos que quando os educandos se sentem parte da escola, podendo até mesmo decidir sobre as questões importantes de organização do ambiente escolar e do processo de ensino-aprendizagem, já estão realizando um exercício que servirá mais tarde para a sua vida social e também passam a sentir-se atores de construção deste espaço.
Sonhar é preciso, mas para conquistar esse sonho é preciso manter os pés no chão. Assim vamos construindo a cada dia a escola diferente, tendo claro de que esse lugar (chão da escola) é permeado por contradições do cotidiano, que precisam ser potencializadas e transformadas em motivadores naturais, para que se desencadeiem estudos ampliados, saindo da caixinha do padrão da escola convencional.
Temos a clareza de que vivemos em uma sociedade capitalista que estimula competição e o individualismo, valores que conduzem para a desigualdade e a injustiça, por isso, enfatizamos sempre a necessidade de construir relações, que estimulem a cooperação e o trabalho coletivo, não somente na escola, mas nos espaços de vivencia que os educandos frequentam.
Mesmo que tenhamos uma visão diferenciada sobre educação, ainda estamos presos a questões institucionais, afinal dentro da estrutura educacional no país, a nota é o que seleciona as oportunidades de estudo dentro do ensino superior. Desse modo não podemos deixar também de contribuir para que nossos educandos possam ter acesso ás Universidades de qualidade e uma das formas atualmente de acesso a esse espaço é o Exame Nacional de Ensino Médio (ENEM). Por isso todos os anos a escola busca planejar e executar um trabalho pedagógico diferenciado em função da preparação dos educandos para a realização desta prova. Felizmente em 2009, fruto de um trabalho coletivo e de esforço de todos dentro da escola, conquistamos um ótimo resultado, obtendo a melhor nota do município e ficando entre as melhores da região oeste de Santa Catarina.
É preciso ressaltar não a nota obtida, mas o fato de que a E.E.M. Semente da Conquista, uma escola do Movimento Sem Terra, que conta com mínimos recursos, estrutura física limitada, ficou a frente de escola particulares, que contam com todo o recurso que precisam, mas que não estão preocupados muitas vezes com o ser humano que estão formando. Enche-nos de orgulho fazer parte desse projeto e hoje poder ver muitos daqueles educandos que ajudamos a formar, frequentando um espaço que muitas vezes é negado a classe trabalhadora, a Universidade.
Para finalizar, não poderia deixar de registrar nossa indignação com a mídia capitalista, afinal não fizeram a mínima questão de divulgar essa conquista das famílias assentadas. Por que será que a classe capitalista/burguesa tem tanto medo da evolução da educação dentro da classe trabalhadora? Por que não querem que a sociedade em geral conheça a verdade do nosso projeto de educação? O que dentro da pedagogia do MST assusta tanto a elite? Essas são questões que ficam como pano de fundo nessa história, que continua e sempre continuará até que conquistemos a transformação social que buscamos em nosso dia-a-dia.
Jose Ronaldo è Graduado em pedagogia pela UFES e,Especialista em EJA pela UFSC,e militante social
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